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Vovó mecânica de automóvel dá lição de vida e de medicina alternativa

A voz calma, pausada e segura complementa suavemente a personalidade forte, ágil e empreendedora de Bernardina Aguillar Gonçalves, que apesar dos 75 anos de vida ainda conserta carros e dá aulas de mecânica para jovens internos do abrigo para menores infratores em Macaé. Dona de uma personalidade com muito magnetismo, Vovó Bernardina – como é conhecida por muitos – é uma lição de vida: mecânica de automóveis por paixão desde criança; tem em seu currículo conquistas das quais se orgulha como a de formar milhares de mecânicos, de sustentar seus três filhos apenas com seu trabalho, desenvolver projetos sociais por conta própria, ter um diploma de medicina natural alternativa, profissão que já exerce há três anos, além de ser escritora e missionária.

 

Bernardina é considerada a mecânica mais antiga do país, ainda atuando na profissão. “Eu descobri essa paixão quando era criança. Meu pai era madeireiro e minha mãe parteira, em Minas Gerais, mas eu via aquele monte de caminhão estacionado no pátio da fazenda e pensava que queria dirigir. Com o tempo vi que meu interesse era no seu funcionamento”, comenta sorrindo. Isso lhe custou a desaprovação e o isolamento familiar por considerar a profissão de mecânica incoerente com o fato de ser mulher. “Eu fui primeiro para São Paulo, onde vi que não dava para ficar sozinha e me casei. Viemos para o Rio e tivemos nossos três filhos, mas meu marido não queria que eu fizesse nada que fosse fora de casa. Ele brigava muito quando eu consertava nossos carros ou resolvia ir para as festas sem ele. Por fim, nos separamos e eu me vi completamente sozinha com três filhos para criar” relembra.

 

Consertar carro foi seu primeiro pensamento como profissão. Com sorriso maroto estampado no rosto, Bernardina conta que mentiu para fazer o curso de mecânica no Senac. Disse que era solteira, apesar de legalmente casada. “Eles não permitiam que mulheres fizessem o curso. Casada então nem podia se matricular. Eu arrumei meu documento de solteira e me inscrevi. Os meus colegas me maltratavam dizendo que mecânica não é profissão para mulher. Me mandavam fazer os trabalhos mais difíceis e pesados. Mas sabe o que aprendi?” Pergunta ela respondendo imediatamente. “Que essa dificuldade foi o que mais me ensinou a profissão, porque eu aprendi o que muitos não conheciam. Esse desafio me fez lutar pela vida e pelos meus filhos”.

 

Quando montou sua oficina em Macaé, ela viu a dificuldade de seu tempo de aprendizado em outros e com isso, entre as horas de trabalho nos carros de clientes, resolveu dar aulas aos mais carentes. Sua didática, o carinho com os alunos e o conhecimento profissional fizeram dela uma pessoa reconhecida, a ponto de ser convidada a dar aulas de mecânica no Paraguai, Argentina e em várias cidades brasileiras. “Dei aula para milhares de pessoas, homens e mulheres, que hoje têm suas oficinas. Por isso resolvi ensinar os jovens que estão internados nos centros de internação de menores infratores. E os resultados são bons. Se de cada dez menores infratores eu conseguir resgatar um, oferecendo uma chance de profissionalização, me sinto realizada”, fala Bernardina.

 

E ela comprova, mostrando em fotografia, os mecânicos de hoje e chefes de família que eram jovens envolvidos com drogas e roubo. Esses profissionais são convidados por ela a contar sua história aos adolescentes internos como incentivo para uma mudança de vida. Em Macaé, esse trabalho social com jovens recebe apoio de empresas como a Sistema Integrado de Transporte (SIT), a Remac, a Auto Viação 1001 que cedem as garagens, as ferramentas e os veículos pesados para as aulas práticas. Conhecidos ajudam financeiramente. “Um senhor do Lagomar me dá R$ 20  para fazer cópias das apostilas. Já ajuda muito”, agradece Bernardina o apoio recebido. De ajuda política ela resume numa frase curta. “Se eles te ajudam uma vez, te pedem sempre algo em troca e nunca mais dão nada. Por isso não me envolvo com eles”.

 

Incansável, Bernardina ministra palestras sobre medicina natural gratuitamente e seu próximo projeto é criar no Lagomar – bairro onde reside há anos – um lava a jato ecológico para jovens e adultos carentes, aprenderem uma nova profissão e também noções de preservação ambiental. “O planeta precisa ser cuidado. Sem ele morreremos; sem a natureza não somos nada”, justifica a mecânica e médica naturalista que vê semelhanças entre o carro e o ser humano. Segundo ela, ambos adoecem, precisam de tratamento e têm todos os órgãos, exceto os reprodutores no carro. “Basta ouvir e ter a sensibilidade de sentir os ruídos dos carros e os sintomas dos pacientes. Mecânica e medicina são semelhantes. Tudo que é preciso para exercer essas profissões são dedicação, estudo e amor ao que se faz”, conclui Bernardina.

Imagem Perfil Redação Portal Cidades BR

redação

Jornalista, especializada em economia, petróleo e assessoria de comunicação empresarial e pessoal.

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